Meu filho vai pra guerra.
Meu filho vai pra guerra.
Houve um tempo em que os filhos eram tirados novinhos da proteção dos pais e criados para virar guerreiros.
Crescidos e bem treinados eram enviados para as guerras sem fim, de uma antiguidade onde tudo se resolvia a golpe de espadas.
Muitos não retornavam. Os que conseguiam, traziam nas bolsas os prêmios da vitória. E no corpo as marcas das luta: cicatrizes, mãos amputadas, pernas mancas.
Hoje em dia, para a alívio das mães, nossos filhos não são mais confiscados no berço em defesa da pátria. Mas nem por isso deixarão de guerrear. E com nosso apoio e estímulo.
Preparamos nossos filhos desde a mais tenra idade para a batalha da vida moderna. Queremos que eles sejam bilingues, que estudem nas melhores escolas, que façam esportes, informática, música, artes, kumon, simulados etc. Para quê? Para terem mais chances de vencer uma outra guerra. A guerra do mercado. Onde só sobrevivem os mais preparados. E dá-lhes preparação. Não queremos criar perdedores!
Daí, um dia, eles partem pra luta. Enfrentam competição desumana, superiores autoritários, convivem com o facão do RH dia e noite nos seus pescoços, comem mal, dormem pouco, sofrem com as explosões na bolsa de valores e com os tiroteios da vida corporativa, não tem tempo para ver os amigos.
Os anos passam e quem vence exibe o carrão lustroso, a parafernália raitéc, o quiosque do churrasco, a cozinha de aço inox, o armário repleto de roupas que não dá pra se usar numa vida. Trazem nas carteiras os cartões de crédito que financiam os prêmios da vitória. E no corpo, as marcas da luta: sobrepeso, estresse, pressão alta, diabetes, insônia, inapetência sexual, tabagismo, alcoolismo, dependência química, solidão, consumo compulsivo, filhos carentes...só para citar alguns dos males dos guerreiros e guerreiras de hoje.
Como as mães de antigamente, os receberemos sempre de braços abertos, cheias de alegria e festa. E no fundo do peito a agonia de quem sabe que o preço da luta é alto demais.
Me pergunto se as mães da antiguidade de vez em quando também questionavam: "Filho meu, essa guerra à qual você tanto se dedica, é mesmo em benefício de quem?"
Comentários
Sempre consegue nos encurralar na missão de educar um pequeno ser e questionar para que mesmo que trabalhamos tanto... Eu mesmo vivo na dúvida quanto a isso, mas vamos indo tentando dar mais atenção para o pequeno filhote, enquanto ele aceita e tentando achar um sutil equilíbrio com a vida profissional para que ela não atrapalhe tanto meu convívio com a família... Mas sempre fica aquela voz lá dentro que me pergunta:
E aí, não vai dar mais tempo para mim?
Sempre acho que quem me chama é meu filho...
Beijos Dri
Já falam em incluir alguma medida do uso do tempo e da felicidade humana nos principais indicadores econômicos, já se questiona bastante se o ter é mesmo tão importante quanto o curtir. E, aos pouquinhos, a gente vai fazendo a nossa parte, ensinando pras crianças que dinheiro e posses (olha aí o assunto do outro post) não fazem a felicidade da gente. Que bom mesmo é brincar de pular corda descalça na rua (apesar dos protestos da mamãe!), esconde-esconde, pique-pega, bicicleta.
O duro é que, hoje em dia, pra podermos deixar as crianças soltas na rua, precisamos nos cercar num condomínio fechado, morar em vilas ou ruas-sem-saída... Porque as pessoas ainda não desaceleraram o suficiente, em todos os sentidos, para deixar as ruas seguras pros nossos pequenos.
Parabéns, mais uma vez.
Que texto bem escrito!
Adorei o post!!
É bem isso mesmo, sempre haverá uma luta, mas podemos intervir muito quando ainda há tempo...
Beijocas
Ju
Parabéns!
abs!
O mais amargo é que as mães dos vencedores gastaram a vida para faze-los assim, e nào podem admitir,por um segundo, que desperdiçaram suas(delas e dos filhos) vidas nessa busca.
E no fim, apenas aqueles que aceitam as derrotas conseguem enxergar novos caminhos, mais saudáveis, mais felizes.
E nossos grilhões quanto aos filhos estão geralmente linkados ao que virá, ao desconhecido, que não se pode adivinhar, o futuro ,e o que será quando não estivermos mais por perto..
Enfim, as coisas são o que são por nossas escolhas.E de nada adiantaria questionar um filho treinado por você mesmo quanto ao que ele está fazendo.
bjo
Me chamaram de louca porque eu disse que, eu não iria dizer o que minhas filhas devem fazer, mas que eu torço e me esforço atráves de exemplos pra que não seja algo mortifero, super concorrente do mercado de trabalho.
Não é que não se deva trabalhar muito ou pouco. A questão é pra que?
Pra que se trabalha hoje?
Quero que minhas filhas encontrem o prazer no trabalho, assim como eu encontrei. Eu sai dessa guerra e fui para a paz. Até hoje sou crucificada por isso e me acham louca e dizem que sempre quero fazer diferente.
Bom, algum problema em ser um ser pensante e não ir com a massa toda?
Eu digo sempre: filhas minhas, o que vocês gostam de fazer? O seu trabalho precisa ser prazeroso. Existem muitas coisas para fazer neste mundo e não só o que você vê por ai. Existe mais que correria, dinheiro, competição, carro novo.
E começa pelo nosso estilo de vida!
Paloma e Isa
É, filha, e a gente se preocupava com a parte operacional de dar banho e trocar fraldas. Eu sempre achei que cuidar era mole, criar é que são elas.
Belo blog, a propósito!
Parabéns por essa analogia tão genial: guerra de ontem x competitividade de hoje!!!
Venho há uns tempos "desacelerando".É difícil, eu sei, mas tenho tentado dar uma caminhada com os filhos no fim da tarde, um sorvete nos sábados, uma chegadinha na livraria com eles, que amam ler como eu.Parece pouco, mas acho que podemos ir diminuindo o ritmo e mostrar a eles, pobres pequenos, que as suas companhias também são importantes e prezadas por nós!
Parabéns pela forma clara de escrever.E bela, como sempre.
Hj fui no encontro de 20 anos do ECA (estatuto da criança e do adolescente) e definitivamente vc deveria estar lá... foi muito bom.
Em muitos momentos foi emocionante.
Mas senti falta da parte que nós lutamos aqui, por um direito a infância por parte das crianças que não se encontram em situação de vulnerabilidade social, pq de qualquer forma, são crianças que muitas das vezes tem seus direitos negados.
Enfim, acabei de chegar e ainda estou absorvendo boa parte do que foi dito e debatido. No geral, foi um dia produtivo para refletir por muito tempo.
Bjs
Beijos!
Nine
Vivo aflita em tentar achar o meio termo, para nem prepará-lo demais, nem de menos...
E me pego direto preocupada em imaginar como será a vida dele daqui uns 10 ou 15 anos.
Se hj já é essa loucura...
Bjus
Vivo aflita em tentar achar o meio termo, para nem prepará-lo demais, nem de menos...
E me pego direto preocupada em imaginar como será a vida dele daqui uns 10 ou 15 anos.
Se hj já é essa loucura...
Bjus
Vc falou de coisas que me preocupam sempre, como achar o equilíbrio na educação dos filhos, o que é importante realmente na vida das pessoas, etc.
Bjo.
Seu blog está profissional ! Só matérias conscientizadoras! Realmente a guerra de hoje é bem mais "sangrenta". Excelente comparação. Parabéns !
Beijos
Hilda