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Mostrando postagens de agosto, 2016

Caixa de Pandora

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Caixa de Pandora Tia Lourdes era solteira, funcionária pública, baixinha, cabelos curtos e grisalhos. Tinha tudo para ser a mais previsível das criaturas. Mas, vira e mexe, nos surpreendia. Éramos criança quando ela nos visitou pela primeira vez. Antes de sair para dar uma volta, perguntou qual brinquedo gostaríamos de ganhar. Foi minha primeira arregalada de olhos. Nunca um adulto tinha nos feito essa pergunta fora do Natal. Fizemos os pedidos e não acreditei quando ela tirou da sacola o jogo Detetive. Era exatamente o que eu havia pedido. Nem Papai Noel, que nos trouxe Monark ao invés da Caloi, atendia à risca nossos desejos.  Fui morar com ela quando tinha 17 anos. Eu era uma adolescente difícil. Saí um ano depois, brigada. Ficamos um tempo sem nos falar e, de repente, estávamos de volta às boas, como se nada tivesse acontecido. Ela me tirou do apartamento dela, mas nunca me tirou de sua vida. Desse período, tenho algumas lembranças. Uma delas é que nem um grão de

Dois pais

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Dois pais.  A filha de um deles tinha cinco anos e desenhava na mesa da copa. No calor tórrido do noroeste paulista, ela usava uma calcinha de crochê vermelho. O filho do outro já era adulto e consertava o fogão da residência. Tinha tocado a campainha e perguntado se tinha fogão pra arrumar. Na boa fé das gentes do interior, ele foi colocado pra dentro e levado pra cozinha. A menina não suspeitou quando o rapaz se aproximou por trás e pediu pra ver seus desenhos. Ficou feliz quando ele começou a elogiá-los. Só achou estranho quando, em meio aos elogios, sentiu os dedos dele entrarem por dentro da sua calcinha.  Ele era tão simpático, mas aquilo era entranho. E, ao mesmo tempo que uma voz lhe dizia: “Isso não é nada, é só carinho", a outra incomodava: “O papai te faz carinho assim? Seus tios te fazem carinho assim?" A menina resolveu afastar-se. Correu para o quarto da mãe, encolheu-se num canto e botou na boca o dedão que há anos não chupava. Qu