A escola interativa começa a existir



A escola interativa começa a existir.

Uma das mais ousadas experiências em educação pública está pra acontecer em São José dos Campos. A cidade, polo aeroespacial, agora também vai levar tecnologia para todas as escolas municipais. É o projeto Escola Interativa, que já começou dando um notebook para todos os professores e instalando projetores interativos e banda larga de 30 mega, nas 600 salas de aula do ensino fundamental. Agora, a partir do segundo semestre, o projeto se amplia com a doação de um tablet por aluno do 6º ao 9º ano e, a partir do ano que vem, do 1º ao 5º.

O que mais me chamou a atenção neste projeto é que, apesar de sua grandiosidade, ele foi concebido para ser apenas mais uma ferramenta para o professor, que ocupa lugar central no plano. O sistema lhe dá total autonomia de uso, permitindo que ele escolha como usar as ferramentas e quando. Também permite a gestão total dos tablets dos alunos. Por exemplo, ele pode bloqueá-los quando quer a galerinha focada em algo específico, liberar apenas alguns, liberar todos, montar grupos na sala com atividades diversificadas. Pode também monitorar o que os alunos estão trabalhando em suas telinhas, projetando-as na lousa inteligente e compartilhando diferentes modos de resolução e achados individuais.

Não há conteúdo ou software obrigatório e o professor tem autonomia para montar sua aula. Soube de uma professora de geografia que, a partir do vídeo “Stand by Me”, tocado por músicos de rua em diferentes partes do mundo, levou os alunos a um tour virtual por todas as cidades que aparecem no clipe, através do Google Earth, observando localização, topografia, modelos dos carros, estilo de casas, etnia, arquitetura, etc., ampliando os horizontes dos alunos para muito além do livro didático e das paredes da sala.

Seria ingênuo achar que o uso da tecnologia é a solução dos problemas do ensino público e privado. Não é e está longe de ser. Mas, é inegável que inserir de forma planejada uma ferramenta que hoje é presente em todo o planeta - menos nas escolas - aproximará mais as salas de aula da realidade dos alunos. Prender a atenção de uma turminha que nasceu megabitizada tem sido cada vez mais difícil. Culpam-se todos, os pais que não educam, o excesso de açúcar, o celular, mas o fato é que aumenta a cada dia a distância entre o que se aprende na escola com o que se vê no mundo e, ingênuo, é querer que a meninada fique 5 horas olhando para uma lousa verde, pelo simples “amor ao estudo”.

São José está dando um primeiro passo. Não será um passo fácil. A proposta exige o engajamento e a conscientização das famílias, não só para os cuidados com o equipamento, mas também para o monitoramento do uso dos tablets em casa. Para isso, a prefeitura montou um ônibus equipado com uma réplica da sala de aula multimeio, que visitará as comunidades apresentando o projeto aos pais. Há também bloqueio de pornografia e um app que permite aos pais gerenciar o equipamento.

Mas o pulo do gato será capacitar o professor. Novas ferramentas exigem novas práticas. Por exemplo, um professor acostumado em encher o quadro com textos para os alunos copiarem, se continuar fazendo o mesmo, vai continuar tendo alunos irriquietos, distraídos e provavelmente indisciplinados. E não há tecnologia do mundo que resolva. Mesmo porque, o sistema salva as aulas e compartilha com os tablets, portanto se a cópia já não fazia sentido na época da caneta e do caderno, imagina agora.

Acredito que leve um tempo para que o professor se familiarize com o equipamento, mas acho que as respostas por parte deles serão rápidas. O saber do professor é imenso e esse saber está sendo não apenas respeitado, mas valorizado. Ter disponível em sala ferramentas que permitam que ele enriqueça sua prática com os recursos do mundo digital, lhe abrirá um universo de novas oportunidades. E, o mais curioso, é que os estudantes terão um conhecimento a mais que os mestres. Eles já vem de casa capacitados para usar o equipamento e saberão, sem dúvida alguma, operá-lo com mais facilidade que os adultos. Portanto, o professor que for aberto para a colaboração dos alunos, terá mais um fator de aproximação a seu favor, colocando todos como mestres e aprendizes, numa linha horizontal de troca de saberes.

Há dois pontos que incomodam. As escolas estaduais não fazem parte do programa, criando na cidade os “com” e “sem tecnologia”. Pergunto também o que será desses meninos e meninas ao terminar o fundamental neste novo universo e ingressar no ensino médio "quadro negro e giz" das escolas públicas e de muitas particulares. Será um “de volta pro passado” caótico e cruel.

Mas tirando a eterna falta de sincronia entre governos estaduais e municipais, estou empolgada e quero acompanhar de perto o que vai acontecer. Se vai dar certo? Não sabemos, mas como disse nosso vizinho, Presidente Mujica, como evoluir sem experimentar? São José dos Campos está liderando uma experiência inovadora em educação, principalmente, por acreditar na autonomia e na capacidade dos educadores e dos alunos. Também por usar dinheiro público para a construção de  saber.

Só isso já é algo lindo.


Grafite de Jakub Halun



Comentários

A Dona do LAr disse…
Também fico feliz por ver que o governo (mesmo que somente o municipal está dando um passo rumo a proporcionar uma escola mais interativa e interessante aos alunos. Na verdade, só estou escrevendo para fazer uma observação. Vc disse que acredita que os professores se adaptarão rapidamente as novas ferramentas. Infelizmente eu não tenho tanta certeza disso. Espero que haja de fato uma capacitação para esses professores, porque pelo que vejo aqui na minha região muitos professores não se adaptam tão facilmente a esses tipos de novidades. Muitos simplesmente porque não querem sair da zona de conforto e outros (em especial os mais velhos)devido a dificuldade encontradas mesmo. Meu marido é coordenador de ensino numa escola estadual e ele diz que há uma grande dificuldade em fazer com que os professores entendam a importancia de se reciclarem. Ele diz há muita dificuldade em empregar na escola coisas aparentemente simples como, por exemplo, digitar as notas dos alunos antes feita no antigo diário de sala (tendo em vista que hj há a secretaria digital, onde tudo é digitalizado).Sendo assim, infelizmente esses tipos de novidade nem sempre são tão bem vindas pelo proprio corpo docente da escola.
Anônimo disse…
É lindo, mas está faltando papel para trabalhar. E aí ? Usaram a verba e deixaram sem o básico ?