O lanche no lixo




O lanche no lixo

O menino começou a devolver a merenda sem comê-la. A mãe estranhou. Normalmente ele era morto de fome, mas o lanche, preparado com tanto carinho, estava voltando intacto.

As desculpas habituais "eu tava sem fome", "quis jogar bola no recreio" não colaram. Uma observação atenta e ela percebeu que o adolescente estava com vergonha de levar lanche de casa. Abrir a mochila e enfrentar o olhar da galera diante de um sanduba no pão integral ou de uma fruta, para ele era a morte. Queria comer os salgados da cantina, como os demais colegas. 

A mãe, do tipo natureba econômica, argumentou que o lanche que ela fazia era muito mais saudável que o da cantina e, além disso, ela e o marido suavam para pagar a escola particular. Lanche da cantinha era um luxo para os dias em que o despertador falhava e não dava tempo de preparar nada.

Um empaca daqui, o outro dali e, passados seis meses de lanches devolvidos, a mãe desiste. 

"Olha, não vou mais fazer lanche pra você. Os ingredientes estão aqui. Se quiser merenda, prepare você mesmo. Mas não gasto mais tempo e dinheiro pra acabar tudo no lixo." 

O menino deu de ombros e, para agonia da mãe, cursou o restante do ano sem levar merenda. 

No ano seguinte, o garoto entrou para o ensino médio. Saiu da escola particular e foi para a pública. 

Depois de alguns meses, ele chega com a novidade. 

"Mãe, começaram a dar lanche seco de graça na escola." 

"Que legal! E o que é lanche seco?" 

"Bolinho pronto, bolacha recheada, suco de caixinha. Mãe...é ruim demais! Não consigo comer. Será que você me faz um daqueles seus lanches naturais?" 

A mãe abraçou o menino e só faltou soltar rojão. 

No dia seguinte, acordou cedo e preparou um sanduíche com todo carinho. Pão integral, patê de frango desfiado com coalhada seca, azeite, cenoura ralada, uma folha de alface, pimenta do reino e voilá! 

Entregou o lanche ao menino e torceu para reação dos amigos da nova escola não ser negativa. Temia que, se fosse zoado, a vergonha voltasse a dominá-lo. Agora com o agravante dele ter acesso gratuito ao universo de porcarias industrializadas e recheadas que a família sempre evitou. 

Aguardou ansiosa a volta do filho e a primeira coisa que perguntou foi se ele tinha gostado do lanche.

"Tava uma delícia. Mas você não vai acreditar…uma amiga me pediu uma mordida, depois outra e roubaram meu lanche! Saíram andando com ele na cara dura! Falaram pra amanhã eu levar seu lanche pra galera toda." 

A mãe deu risada. Graças à garotada mundo real da escola pública, o lanche caseiro estava de volta à cena. 
E em grande estilo. 



Foto retirada do My Recipe Magic. 

Comentários

Vanessa Nassif disse…
Sabe de uma coisa, estou ficando louca com meu filho na escola: final de ano, recuperação e ai vem aquela pergunta, sera que eu devia ter sido mais dura, castigo, mandar estudar .... Oh My God ! Ai leio sua materia sobre o lanche, pode não ser 100% igual a historia ,mas da algum conforto em saber que as vezes temos que persistir e acreditar que a criança tambem vai se construindo com o que lhe deixamos pensar e agir e não só agindo por ela ou impondo . Mas que é dificil é ....HELP !!!!
Alessandra disse…
Adorei!!! Estou mais ou menos passando por isto com minha filha. Saiu de uma escola Waldorf, com lanches naturais, e descobriu toddynhos, sucos de caixinha, biscoitos recheados e salgadinhos... Pro meu desespero. Só q ela só tem 6 anos!!! Como a maioria das crianças come muita porcaria industrializada. Pra minha sorte, nunca tomou refrigerante, kidoguinho nem hamburguinho, nenhum embutido. Nem quer provar.
Valeu pelo texto!
Alessandra disse…
Adorei!!! Estou mais ou menos passando por isto com minha filha. Saiu de uma escola Waldorf, com lanches naturais, e descobriu toddynhos, sucos de caixinha, biscoitos recheados e salgadinhos... Pro meu desespero. Só q ela só tem 6 anos!!! Como a maioria das crianças come muita porcaria industrializada. Pra minha sorte, nunca tomou refrigerante, kidoguinho nem hamburguinho, nenhum embutido. Nem quer provar.
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