Pais x Professores - quem perde são nossos filhos.



Pais x Professores - quem perde são nossos filhos.

Até há pouco tempo, filhos eram criados meio que em comunidade. Era a bronca do pai, o olho da vizinha quando a mãe estava fora, o colo dos avós, os conselhos das tias, as iniciações com os primos, as brigas e brincadeiras na rua, os puxões de orelha da professora e do inspetor de alunos.

Além do convívio próximo com todas estas pessoas, havia também uma espécie de código de conduta que todos conheciam e faziam valer. Tinha que respeitar os mais velhos; apanhou na rua apanhava em casa; quem não obedecia ficava de castigo; o irmão mais velho resolvia as brigas; e o pai nunca podia saber de nada ou ele matava um.

Não preciso dizer que hoje tudo mudou e não foram só os códigos que ficaram confusos. Vivemos num certo estado de solidão familiar, isolados por muros, ruas onde não se brinca e o concreto dos apartamentos. A extraordinárias  tarefa de se criar uma criança, acabou ficando restrita a 2 agentes: família e escola.

Família, leia-se pai e mãe. Às vezes só pai, muitas vezes só mãe e com frequência representados, grande parte do dia, por empregada, televisão ou videogame.

Escola, leia-se escola mesmo. A instituição educativa onde nossos filhos hoje entram usando fraldas e só saem quando já usam camisinha. Alguns chegando a passar quase mais tempo na escola do que em casa.

Agora vem a dúvida: se somos só nós, pais e educadores diante desse mundo caótico, arregaçando as mangas para criar gente do bem, por que nos entendemos tão pouco?

Recentemente, fui convidada para conversar com um grupo de professores de um curso de pós-graduação que estuda as relações com a família. A ideia era transmitir a eles meu ponto de vista de mãe. A visão do lado de cá.

A conversa foi muito boa e profícua em todos os sentidos. Estava diante de um grupo de educadores desarmados, abertos para escutar, a fim de entender porque esta troca não acontece com mais frequência no dia-a-dia da escola. Profissionais preocupados com o imenso abismo que se abriu entre escola e família e que nos impede de escutar, falar a mesma língua e entender.

Um ponto curioso da nossa conversa, foi quando listei o que os pais acham que os educadores pensam deles. Apresentei uma lista que incluía itens como: não nos escutam, vivem na defensiva, transferem para nós responsabilidades que não são nossas, acham que não estamos presentes e que não impomos limites, acham que não estamos nem aí e etc. Nesta hora, um professor pede a palavra e diz, sorrindo, que eles haviam elaborado a mesma lista na semana anterior, só que com o que os professores acham que a família pensa deles. E a lista era praticamente a mesma!

Curioso e triste. Porque como principais referências na formação dos nossos filhos, deveríamos ser mais cúmplices um do outro. Mais abertos para ouvir, para dialogar, para trocar e confiar.

Não a confiança cega de outrora, quando professores podiam até bater para impor respeito e os pais chamavam de burro o filho que tirava notas baixas. Essa, graças aos novos tempos, não volta mais.

Falo de uma confiança culta e sadia. Confiança de quem se conhece e se cobra, porém sabendo das qualidades, das dificuldades e dos limites de cada um.

Confiança de quem assume que ninguém é dono da verdade. E que estamos todos tentando sobreviver neste mundo em rápida transformação, sem as referências do passado e sem ideia alguma de como será o futuro.

Assim como nós pais às vezes nos perdemos (a Supernanny que o diga), nem sempre a escola tem a solução pronta e certa para os problemas. O importante é estarmos abertos para discuti-los, haver transparência, honestidade e a certeza que juntos, somos muito melhores que separados.

Precisamos reconstruir as pontes que caíram no furacão das mudanças e nos colocaram em lados opostos. Porque no meio, estão nossos filhos.

Sair da defensiva e dialogar, pode ser um começo.

Comentários

Angelita disse…
É isso mesmo se ambas andassem juntas tudo seria mais fácil,engraçado fiz um post sobre escola a uns dias atras,relatando uma reunião que os professores fizeram c/ os pais da escolinha de minha filha(maternalII)fomos lá p/ exatamente isso jogarem tudo p/ cima de nós,mas peraí se temos que sociabilizar nossos filhos ambos temos responsabilidades.Seria mais fácil então criar e ensinar em casa,certo?Adorei seu post e seu blog por inteiro.BJUS!
DANY disse…
TAIS
PARABENS PELO SEU BLOG, PELO TEXTO E POR SEU PONTO DE VISTA SEMPRE EQUILIBRADO DE TANTOS ASSUNTOS ABORDADOR NO SEU BLOG. ADOREI O TEXTO E COMO MÃE E EDUCADORA COMPARTILHO DE SEU PONBTO DE VISTA.
MAIS UMA VEZ PARABENS!!!
ABRAÇOS
Unknown disse…
Ai Taís, vc tocou num ponto tão importante, essa relação de pais e escola parece que realmente está ficando cada vez mais distante. A impressão que dá mesmo é que um fica jogando a responsabilidade e a culpa no outro. Ninguém senta pra reconhecer suas falhas e tentar melhorar, através de um diálogo aber e sincero. Difícil mesmo.


Obrigada por compartilhar seu ponto de vista,sempre coerente.

Bjos
Fe Piovezani disse…
Tais, tomei a liberdade de copiar duas frasezinhas suas e colocar no meu post.
Você tocou num assunto que eu gostaria muito de falar: o da falta de diálogo e amizade entre pais e professores. Um critica o outro e quem fica no meio são nossos filhos. Um beijo grande e se puder passar lá no blog para completar alguma coisa, eu ficarei feliz.
Fe
Mãe da Lulú
nandapiovezani.blogspot.com
Marina Queiroz disse…
Tais
Como Pedagoga, atuo em escola e em sala de aula. Concordo com você, mas a única coisa que tenho a dizer é que, se muitas vezes é tão dificil para a família educar coerentemente uma, duas ou três crianças, imagina para a escola, sala de aula, lidando com 20, 30 cabecinhas diferentes.
Falta mesmo muito diálogo a fim de entender que a crinça leva para a escola aquilo que ela aprende em casa, sempre.
Carolina Pombo disse…
Taís, semanas atrás passei por uma situação que ilustra o seu texto. Fui conversar com a coordenadora e a professora de minha filha, porque ela começou a não querer mais ir pra escola e a dizer que estava com medo. Estava chegando machucada em casa com uma certa frequencia e a professora sempre muito atenciosa me explicava os incidentes. Mas, como mãe e vendo a reação de Laura (que já tem uma personalidade mais tímida), resolvi conversar com a escola. A fala da coordenadora já partiu do velho preconceito de que a idade da Laura é a idade dos limites e que ela estava triste porque estava lidando com novos limites e que eu deveria "respeitar os tempos da escola". Ela me descreveu uma criança muito diferente de miha filha e falou de forma bem generalizada. Mas, enfim, consegui me fazer ouvir e a professora conseguiu falar e amenizar minha ansiedade, para que, apesar da coordenadora, a gente conseguisse se entender.

Acho que os ruídos acontecem porque as escolas tem medo de críticas. Querem manter sempre uma "fachada" de excelência, para manterem os "clientes" e assim acabam jogando as responsabilidades nos ombros dos pais. Gostei da postura da professora de Laura, porque ela soube ouvir, soube dizer que não estava entendo bem o que estava acontecendo, mas que ia mudar um pouco a estratégia com ela. E funcionou! Em dois dias, voltei a ver a empolgação de Laura com a escola!
A Carolina falou tudo: essa dificuldade de se ter uma comunicação melhor é porque as escolas têm medo de críticas. Acham que, se os pais ganham liberdade para falar, vão só reclamar e falar mal. Senti esse medo nas três escolas pelas quais passei com as meninas. A primeira não conta muito, pelo menos na minha opinião, porque, de fato, não era uma instituição de primeira linha. Tanto que tirei a mais velha de lá porque não tinha "química" entre a gente. Mas da segunda escola elas só saíram porque mudamos de cidade, e na terceira elas continuam até hoje. E, apesar de todos os esforços, eu acredito que falta mais abertura, mais conversa e falta aceitar o fato de que os pais não estão aí pra sabotar o trabalho da escola, mas sim pra ajudar. Afinal, o fato de rematricularmos nossos filhos ano após ano deveria servir para as escolas verem que continuamos confiando no trabalho delas. No momento em que os pais deixam de confiar naquele trabalho, eles simplesmente tiram os filhos da escola. E, numa escola onde há mais diálogo, mais abertura, os problemas podem ser identificados no início, e sua solução pode evitar que o aluno mude de escola.

Meu ex-vizinho, professor e diretor aposentado, que trabalha atualmente com consultoria, costumava dizer que Associações de Pais e Mestres são altamente benéficas, mas que as escolas morrem de medo de criá-las. Eu vejo relatos de amigas que moram fora do Brasil, onde essas associações existem em praticamente todas as escolas, e morro de inveja da maneira como as escolas acolhem e estimulam a participação dos pais em tudo. No Brasil, isso é comum nas escolas Waldorf. Os pais participam de tudo, e nunca vi pais mais fieis como os pais Waldorf.

A gente sabe que é possível e benéfico, resta coragem institucional para aceitar que a maior parte das críticas é construtiva, e que aceitar essa participação é crescer.
Tais Vinha disse…
Pois é, não sei o motivo das escolas ficarem tanto na defensiva. Mas lendo os comentários e os blogs, a gente vê que essa não é uma percepção só minha. Muitos pais se sentem "não acolhidos" quando buscam a escola e responsabilizados por fatos que não lhes compete. Pela conversa com os educadores, o sentimento é inverso e acabamos num emaranhado de sentimentos confusos e conflitantes, que não tem nos levado a lugar nenhum.

Achei interessante o comentário da Mariana, professora. Com todo respeito, Mariana e, de novo, numa tentativa de dialogarmos, mas sua postura defensiva só reafirma nossos sentimentos de distância. Em poucas palavras, vc isentou completamente a escola da responsabilidade ao afirmar que "eles levam para a escola aquilo que aprendem em casa". Piaget e muitos outros estudiosos apontam, que a construção da ética e da moralidade se dá no convívio social. Se as crianças hoje passam a maior parte da vida interagindo socialmente dentro da escola, como isentar a escola de ser agente nesta formação?

De novo, somos parceiros. Não adversários. Criança difícil é difícil até em casa e tudo o que os pais delas não querem é mais dedos apontados dizendo que eles são péssimos pais.
Se nos apoiassemos mais, seria tudo mais fácil, concorda?

Recebi um email de uma educadora, afirmando que muitas vezes, só o fato de pais e escolas conversarem e ficarem atentos para um determinado problema, já traz resultados positivos no comportamento da criança.

Sabe, acho que o primeiro passo para vencermos este abismo seria pararmos de afirmar a culpa é de um ou do outro. A começar que ninguém é culpado de nada. Somos todos seres humanos tentando fazer o nosso melhor. Olharmos um no olho do outro, sermos francos, transparentes e afirmar que vamos tentar buscar uma nova abordagem a partir daquela troca já seria um grande começo.

Bjs! E obrigada!
Tais Vinha disse…
Carolina, já passei por reuniões como vc descreve e são tão frustrantes! É extremamente difícil vc querer ser ouvida, colocando um fato pontual, e ter na sua frente uma pessoa que fica repetindo teoria e não demonstra nem por um minuto ter realmente te ouvido. Ou a muito simpática, com um sorriso mecânico no rosto, e que te dá absoluta certeza que nada vai acontecer. Rs! Isso até dava texto...Dá total sensação que ela está ali comprindo sua função de "atender pais" e a função se resume nisso.

Na minha extensa lista de coordenadoras com as quais conversei (sou bem rodada), poucas e maravilhosas foram realmente atentas, desarmadas e predispostas a resolver o problema.

Por outro lado, tive retornos muito melhores quando conversei diretamente com as professoras. Talvez por estarem ali, no dia a dia, conseguem intervir melhor no problema. Já tive experiências ruins, mas tb ótimos resultados de diálogos abertos com as professoras. Gente que te escuta, entende o que está sendo colocado e se predispõe a mudar ou a propor uma nova estratégia. Só isso já é suficiente para virarmos parceiras.

Bjs
Tais Vinha disse…
Silvia, APM é uma coisa tão legal! Me lembro que meus pais faziam parte da associaçnao da escola pública que estudei. Organizavam a quermesse, bingos, punham luz melhor nas salas, ventiladores. Escola particular podia ter tb. Mas acho que eles temem ingerência. Sabe, gente questionando valor de mensalidade etc. Uma pena este medo. Seria bom em todos os sentidos. Podia ao menos haver um grupo de pais discutindo questões pertinentes. Mesmo que não oficial, como uma apm. Só da porta abrir já seria um avanço. Bjs
Priscila Blazko disse…
Taís, seu texto é excelente e bastante pertinente. Gostaria de compartilhá-lo na escola onde leciono, pode ser?
É exatamente essa parceria que buscamos no dia a dia. E acho que quem está dos dois lados (mãe e professora) pode perceber mais claramente a "rivalidade" existente entre as partes mencionadas.
Abraço.
Hegli disse…
Ai Taís, eu também não sei o motivo das escolas ficarem tanto na defensiva... tenho passado maus bocados este anos com a professora de Portugues. Céus, e tudo que é falado, numa boa, parece que estamos ofendendo e xingando a mãe da professora.
A cada resposta atravessada que recebo fico me questionando se fiz algo de errado, mas percebo com o seu texto e comentários que o problema está generalizado.
Agora fico pensando, eles se queixam (e muito) da familia ausente, da mãe que não liga para nada e quando estamos atentas e tentando colaborar nos acham o quê?
Desculpe a reflexão com gosto amargurado. É raro, mas passa!
Bjus
Oi Tais,

Depois de mais algumas insatisfações e nenhuma providência tomada, resolvi tirar o meu filho da escola onde estava e achamos uma que é um núcleo comunitário com gestão participativa.

Antes de mais nada, fomos convidados a participar de uma reunião com a coordenadora pedagógica.

E fazia tempo que eu não via alguém falar com tanta propriedade do trabalho exercido pela escola mas sem a menor pretensão de nos impressionar e sem medir as palavras ao responder algum questionamento feito pelos pais.

Ao caminharmos pela escola, que é bastante aberta com muitos jardins e pátios uma das mães perguntou: e quando chove? A coordenadora respondeu, quando chove, chove e o espaço fica mais limitado mesmo.

O tom da reunião foi caloroso, mas ao mesmo tempo ela deixou muito claro como as coisas funcionam lá.

Acho importante que a escola seja capaz de dar o seu tom logo de cara. A maioria dos nossos problemas vem do fato de a gente achar que as coisas são de um jeito e depois descobrir que não são.
Carolina Pombo disse…
Taís! Aprendo tanto com você e com suas leitoras! Obrigada!

Beijos de uma mãe que ainda engatinha
Angelita disse…
Taís vc foi o impulso p/ mim,fui na escola conversei e nos entendemos a vice conversou comigo como estivesse me abraçando adorei estou mais tranquila agora veremos se tudo vai andar conforme ela me prometeu.Fiz um post agradecendo à vc e a escola.MUito obrigada!Ganhou uma seguidora assídua!BJUS!
Ana Cláudia disse…
Taís e demais e comentáram, me incluo em todas as experiências trocadas. Inclusive, a escola das crianças me chamou, logo no meu primeiro ano lá como mãe para ser mãe representante. O projeto não vingou e tenho a nítida impressão de que o medo pautou esta decisão. "Erraram" ao me escolher. Eu seria mãe representante dos pais para a escola ou da escola para os pais? Para mim, ficou muito clara a segunda opção. A Carolina definiu muito bem a questão: as críticas não são interessantes para a escola que tem que lidar, mais do que com alunos/pais de alunos, mas com clientes. É frustante ir conversar com a escola e a gente ter que argumentar infinitamente por coisas óbvias, assim como é frustrante estar na presença de pais nas reuniões e ninguém se manifestar, ou darum apoio sequer a algo que é de interesse de todos. Eu já usei várias vezes o argumento: quem perde são as crianças. Vendo os depoimentos de vocês, me sinto triste porque sempre quando penso em trocar de escola, penso que vou encontrar as mesmas coisas ou até piores e me mantenho firme confiando na metodologia que tanto gosto.
minhacaixamagica disse…
Tais, tenho uma lista de sites que preciso encontrar e visitar e o seu nome estava lá. Hoje, procurei acessei e gostei. Já sou sua seguidora e divulgarei. Fiquei um temão me deliciando. Parabéns.
Cris Lourenço disse…
Adorei seu blog!!!
Já estou te seguindo....
... tem selinho pra vc lá no meu blog!!
Bjs...
Cris...
Oi gente,

Olha aí uma iniciativa que pode dar muuuuuuuuito certo:
http://pt.braudel.org.br/pesquisas/arquivos/downloads/escola-charter-artigo.pdf

beijos