Criança e consumo


Criança e consumo.

Semana passada, participei, em São Paulo, do 3º Forum Internacional Criança e Consumo, organizado pelo Instituto Alana.

Um evento para debater este tema, por si só, já é uma grande conquista. Numa sociedade onde consumir é sinônimo de "progresso" e de "subir na vida", chama atenção o fato de existir um grupo cada vez maior de pessoas levantando a mão para perguntar se tem mesmo que ser assim.

O debate sobre o consumo é polêmico. E se torna mais caloroso ainda sob a ótica da infância. Talvez porque envolva muitos agentes: pais, educadores, publicitários, emissoras de tv, fabricantes, governantes, lojistas, parentes, psicólogos. A lista é longa, somos todos guardiões das próximas gerações. E quando há muita gente para culpar, quase sempre esquecemos de apontar o dedo para o nosso umbigo.

Como mãe e publicitária, conheço bem os dois lados da moeda. O lado de lá bota nos pais toda a responsabilidade por "filtrar" as mensagens que chegam às crianças - "Não gostou, mude de canal." E assim esperam se eximir de qualquer responsabilidade pelo assédio diário a que submetem nossos filhos.

O lado de cá se vê perdido em meio a tantos apelos. Do mercado e dos filhos. Desaprendemos a diferenciar necessidades reais das surreais. Confundimos dar coisas materiais com dar afeto. Um presentinho é sinônimo de carinho. E acabamos acostumando nossos filhos com doses quase diárias de "afeto" feito de plástico ou açúcar.

É possível dizer não? É. Mas é extremamente difícil em tempos de ditadura do consumo. Como disse Frei Betto, um dos convidados do Forum, estamos vivendo em um estado totalitarista, tão opressivo quanto qualquer outro, pois somos oprimidos pela necessidade de consumir. Há países que reverenciam Alá, Jeová, Buda. Nós reverenciamos o Deus Consumo. Nossos templos são os shoppings. O terço é o cartão de crédito. O pastor é a TV. E dizer aos nossos filhos que eles não precisam de celular aos 8 anos, é coisa de hereges. De gente chata e inconsequente ameaçada com a queima de milhares de empregos na fogueira.

Eu não acredito em bruxas. Mas que elas existem, existem. E taí um Fórum que não me deixa mentir.

Comentários

Unknown disse…
Eu acredito em bruxas, rsrsr.
E queria que existissem mais. Com mais magia...
Nossa, muito complicado isso do consumo mesmo. O Leo às vezes solta umas frases como, ah, mas meus brinquedos estão velhos, bem que eu podia ganhar um novo...
E lá vai a màe explicar...

Bjoks
Saudade de vc mais aqui...
Tais Vinha disse…
Oi Paula, eu tava pegando no tranco...mas agora vai.

Eu acho que, conforme as crianças vão sendo protegidas, da maneira que é possível, elas acabam mais tranqüilas com relação a comprar. Me lembro que no final do ano, tive que ir a várias lojas de brinquedo, pra comprar presentes de aniversário ou amigo secreto e levei meu filho caçula comigo. Me chamou a atenção o fato dele entrar, explorar gôndolas, me mostrar vários brinquedos que achou legal e na hora de ir embora, sair correndo da loja SEM PEDIR NADA!!! Me belisquei pra ver se não estava sonhando, pus a mão na testa pra medir a febre, mas não. Ele estava supertranqüilo. Muito mais do que se estivessemos comprando presentes para ele.

Mantenha-se firme, garota! E seu pimpolho logo aprende a se divertir de outras formas. Bjs!
Pimenta disse…
Então, é assim mesmo.
Somos obrigados lidar com isso, vamos ensinando e aprendendo com os filhos.
O problema é quando não enxergamos o processo, e nos deixamos levar por ele.
O que eu estou vendo aqui fora,(já te disse que estou na meca do consumo né?)São os pais passando o valor da posse para os pequenos.
Tenho aqui amigos de meus filhos que ao verem qualquer objeto novo nas mãos dos amigos,aparecem com um idêntico no outro dia.E como é facil comprar, os pais compram, sem refletir duas vezes.
E olha que estranho,como a coisa é daninha.
Eu tive que passar a diante umas botas de inverno, maravilhosas, de minha filha, que foram usadas poucas vezes, pois o pé cresceu muito rápido.Novinhas, uma pena.Então achei uma menina brasileira, com o pé do mesmo tamanho e ofereci.Ela foi a casa dela e voltou sem jeito, dizendo que não podia aceitar, pois a mãe dela disse que nada dos outros lhe serviria,pois não presta.
Então.A mãe ensinou para a criança que só o que compramos novo é valoroso.
Então as botas estão aqui na rua, nos pés de uma menina chinesa.Feliz e faceira.
bjos,escrevi demais, como sempre.
Hegli disse…
Taís,
Adorei o post e adorei te conhecer lá no Forum. Pena que nem deu tempo de papaer muito né!?
SObre o tema, como já escrevi lá no meu blog, em casa desde que o Lucas era pequeno nós conversamos com ele sobre o ato de consumir, fazemos perguntinhas simples junto a ele que ajudam a definir uma compra:
EU PRECISO DISTO? ISTO VALE O PREÇO QUE ESTÃO COBRANDO? COMO E ONDE ISSO FOI FABRICADO?
Sempre tentei abarcar os aspectos ambientais, econômicos e sociais de forma didática e simples.
E pelo jeito funcionou. Ele tb é capaz de entrar numa loja de brinquedos e sair sem pedir NADA. No supermercado é a mesma coisa, ele vai com a lista na mão, riscando o que já foi pro carrinho. Fazemos a lista de compras em casa e isso evita os pedidos de coisas desnecessarias. E quando ele quer muito um determinado brinquedo eu digo que pode colocar na lista de desejos de aniversario. Porém ele sabe que no dia terá de escolher apenas uma coisa da lista. Ou seja, não preciso dizer não, nem sim pra tudo e ele não fica pedindo o tempo todo...
Truques de uma mãe risoteira e ambientalista morando numa metrópole altamente consumista, rs.
Bjus
Ann disse…
Ola, acabei de conhecer teu blog. Moro em Londres, a nata do consumismo. Por aqui a coisa e tao feio, que so vivendo mesmo. Se algo quebra ou entorta, vai logo para o lixo e se compra um novo. Tenho um menino de 8 anos e tento me policiar ao maximo e poupa-lo da exposicao de marketing que sabemos ser uma lavagem cerebral. Ele por sua vez ja entende que nao precisamos tudo o que vemos e nao ha necessidade de comprar por comprar. Meu marido neste sentido tem valores muito menos consumistas do que eu e ajuda muito.
Otimo topico!
Tais Vinha disse…
Oi Pimenta, vc agora tá nos EUA? Eta mulher rodada! Vc tocou num ponto fundamental...os filhos muitas vezes seguem os nossos modelos. Esse exemplo que vc citou é muito bom. Dali pra frente, a garotinha não pega mais nada que não seja novo e com a etiqueta da loja. Uma pena.

Acho engraçado quando pessoas não muito próximas perguntam se eu "não me ofenderia" se elas me dessem umas roupas usadas. Significa que na nossa cultura há este tipo de pensamento, certo? Oferecer algo usado pode ser ofensivo. E eu adoro!

Hegli, foi muito legal te conhecer. Seu texto sobre consumismo é muito bom e ensina como levar crianças à reflexão. Não se trata de dizer é caro, não temos dinheiro. É ir além: precisamos disso? Vc tem que comprar outro carrinho? Tá certo cobrarem tanto por isso? Para que precisamos de mais um desses? Adorei o truque da lista de desejos. Vou usá-lo.

Ann, bem vinda! Imagino como deve ser difícil resistir aos apelos de Londres. Tem cada loja e lugarezinhos tão charmosos!

Marido consciente ajuda muito. O meu tb é bem sintonizado com o que penso. Aliás, acho que ele tb tem valores menos consumistas que eu, como vc disse. Assim fica bem mais fácil viver e educar.

Bjs! E obrigada por comentar.