O dia das mães é uma merda!



O dia das mães é uma merda!

As tias contam que sua mãe, já falecida, havia sido uma menina “terrível”. Os causos que justificam tal adjetivo são muitos. Desde pequena, a mãe nunca gostou de usar roupas. A vó teve que costurar suspensórios nas suas calçolas para ela não conseguir arrancá-las e sair peladinha por aí.

Era briguenta como o cão. Uma vez, voltando da escola, ao ser perseguida por um bando de moleques, pegou um ramo de primavera que encontrou numa pilha de podas e foi pra cima deles, botando todos pra correr. 

Contam também que ela amava plantas. A ponto de transformar qualquer lata de Parquetina, óleo, banha, sabão, em vasinho de flor. Um dia, para provocá-la, o irmão mais velho destruiu todos os vasinhos. Irada, ela atirou-lhe uma chave, que naquele tempo eram imensas, e quebrou-lhe um dente.

Adorava brincar de trapezista e uma de suas brincadeiras preferidas era rodopiar no varal, até que um dia caiu e quebrou o coccyx. A filha se lembra dela ter-lhe confessado que sonhava em um dia fugir com o circo.

Crescida, era obrigada a namorar na frente de casa, debaixo do poste de luz. Pois a menina “terrível” estourava as lâmpadas com estilingue para poder beijar no escurinho, fora da supervisão dos pais e, pior, dos irmãos.

O pai queria que ela fizesse o normal, como todas as filhas. Mas ela se recusou. Queria ser enfermeira, para desgosto dele que, naquele tempo, achava que as enfermeiras eram putas de médico. Ela não deu bola, seguiu em frente, cursou o que quis, teve uma carreira linda e virou um dos maiores orgulhos do velho.

Um dos episódios mais engraçados, que entrou pro almanaque da família, foi no Dia das Mães. Durante toda a semana, as rádios tocaram sem parar uma música que dizia “o dia das mães é sagrado, é sagrado, é sagrado”. A música era repetida insistentemente e a homenagem emocionava mamães, que faziam coro cantarolando junto. No dia sagrado, com a parentada reunida na sala e as crianças razoavelmente engomadas, a menina pequenininha, vestida só de calçola e suspensório, pediu silêncio porque ia fazer uma apresentação. Quando todos se calaram ela se posicionou teatralmente como uma rainha do rádio e cantou no ritmo da canção: “O dia das mães éuma merda, é uma merda, é uma merda!”. Comoção geral, a vó tentou agarrá-la para clássica chinelada no bumbum, mas a menina gargalhando, disparou na direção da janela feito um corisco, deu uma ponta e desapareceu por horas nas profundezas do quintal. 

Depois de adulta, a mãe contava que fez aquilo porque não aguentava mais ouvir aquela música. E sorria, feliz. 

A filha se lembrou do episódio, diante do festival de cor de rosa, laços, gatinhos, frases edificantes, vídeos, “lindo!” e “obrigada, meninas”, das redes sociais e do whatsapp no Dia das Mães. E pela forma como reagiu a ele, acredita que não era só a personalidade da mãe que era terrível. Seus genes também. 

Desligou o celular, deu uma ponta pela janela e só reapareceu horas depois. Sorrindo, feliz.



Comentários

hilda disse…
Taís, divertida essa história! Sempre me recordo dela, quando vejo aqueles comerciais melosos do dia das mães! rsrsrs. Sua mãe era singular. Bela homenagem!
hilda disse…
Taís, divertida essa história! Sempre me recordo dela, quando vejo aqueles comerciais melosos do dia das mães! rsrsrs. Sua mãe era singular. Bela homenagem!
Miss Biblioteca disse…
Gostei!
Prefiro sempre as pessoas que escrevem assim!
http://caradecotia.wordpress.com