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Piolhinha

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Piolhinha A classe dos pequenos padecia com uma infestação de piolhos.  Todos os esforços que estavam sendo feitos para resolver o problema pareciam ser em vão. A escola mandava bilhete, os pais tratavam, os piolhentos eram afastados alguns dias e devolvidos sem sequer uma lêndea, mas logo os bichinhos voltavam a atacar sem piedade o couro cabeludo da meninadinha. A mãe não aguentava mais. Sua filha parecia que tinha néctar para atrair piolho. Era mandar pra escola que voltava coçando a cabeça.  Resolve tomar uma atitude. Ela era muito boa nisso. Encontra a professora na porta da sala e, num momento privado, dispara: - Escuta, não é possível isso que está acontecendo! Com certeza tem um foco, alguma criança que a mãe não está tratando. Quem é? A professora olha para um lado, olha pro outro e solta num cochicho:  - A Fulaninha. Você sabe, a mãe dela é supernatural. Tipo super mesmo…não gosta de produtos químicos e se recusa a passar qu...

"Ensina-me a proibir"

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"Ensina-me a proibir" Nas escolas e universidades da idade média, tocadas pela Igreja, um conselho de padres e bispos se reúne e decreta: “está proibido o uso dos livros nas salas de aula. Com os livros, nossos alunos se distraem, não prestam atenção, tem acesso a conteúdo inapropriado, compartilham um conhecimento que muitas vezes desconhecemos. Com os livros, perdemos controle.” Mudem a cena para 2015, coloquem os tablets e celulares no lugar dos livros e não é difícil concluir que estamos vivendo a mesma situação.  Enquanto algumas escolas estão incorporando as tecnologias portáteis no seu dia-a-dia, outras estão proibindo seu uso dentro dos muros. Não pode nem no intervalo e nem na saída. O motivo é praticamente o mesmo dos educadores medievais: medo da perda do controle. Aí vem a reflexão: tablets e celulares estão aí e ninguém mais duvida que vieram pra ficar. A internet também está aí e em breve será tão onipresente que as próximas gerações não cons...

Sair do armário é libertador.

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Sair do armário é libertador. Assumir que você vai votar num candidato do PT não é fácil. A pressão contrária é imensa. As pessoas na sala de jantar presumem que por você estar ali, comendo o que eles comem, vestindo o que eles vestem, bebendo do mesmo vinho, você também tem que pensar igualzinho.  Qualquer questionamento gera desconforto e, muitos simpatizantes da estrela vermelha, pelo bem do encontro, preferem escutar a conversa em estado “Ohmmmmmm”, sem se manifestar.  Confesso que essa tem sido eu em muitos pleitos e rodas sociais. Mas dessa vez, escancarei. Saí do armário, mostrei quem sou, liguei o foda-se.  “Vou votar na Dilma!” E o que aconteceu a seguir foi incrível. Alguns amigos se afastaram. Tudo bem, não eram amigos. Outros se aproximaram. Ueba, a fila andou e com gente bem mais interessante. Alguns discordaram com todo respeito. Continuamos amigos e nossa amizade ganhou transparência e um carinho sincero. ...

O diploma de datilografia

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O diploma de datilografia. Abriu uma pasta com documentos antigos e se deparou com um diploma meio amarelado, de papel encorpado e pequenas trincas nas bordas. No cabeçalho, em letras pomposas, estava escrito “Diploma de Datilografia”. Pegou uma xícara de chá, sentou-se e deixou que viessem as recordações. Estava na sexta série quando a mãe a matriculou no curso de datilografia da Dona Cidinha. Lembrou-se da sala cheia de máquinas Remington, das pilhas de papel jornal que eram aos poucos preenchidas com linhas infinitas de A [espaço] Ç [espaço] S [espaço] L [espaço] D [espaço], dos dedinhos magros que voltavam para casa doloridos e sujos de tinta. Na família era regra que os filhos fizessem o curso de datilografia quando chegassem ao ginásio. Exigência dos pais para que eles se preparassem para o futuro.  Ironia.  O futuro virou presente, o mundo deu mais voltas que as bobinas de fitas preta e vermelha das máquinas de escrever e o curso tão impo...

Barrado no shopping

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Barrado no shopping Ontem, meu filho foi barrado na entrada de pedestres do Shopping Vale Sul, em São José dos Campos. Ele estava sozinho. Assim mesmo, o vigia colocou as mãos em seus ombros e disse que ele não ia entrar porque ali não podia “rolezinho”. Meu filho, indignado, respondeu que aquele era um espaço público/privado e que ele tinha direito de ir e vir. Pediu então que o vigia chamasse o jurídico do Shopping para resolver a questão. Na mesma hora, o guarda pediu desculpas e o liberou. E eu, pra variar, fiquei com a pulga. Meu filho foi barrado porque é adolescente, andava a pé e usava touca.  Depois foi liberado, certamente, porque o vigia identificou no modo dele falar que ele não pertencia à categoria “moleque da perifa”. Me pergunto o que teria acontecido se ao invés de cobrar seus direitos ele tivesse dito: “Qual foi, guardinha?!”, ou “Libera ae, tiozinho!”.  Gestores do Vale Sul, por favor me respondam: onde, na Constituiçã...

Não me convidem para a reunião de Pais e Mestres.

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Não me convidem para a reunião de Pais e Mestres. Queridos educadores, Vocês vivem nos dizendo que a relação escola família é fundamental para o aprendizado dos nossos filhos. Eu também acredito nisso. Por isso lhes peço, na próxima reunião de Pais e Mestres, não me convidem. Prefiro não mais comparecer, pois todas as vezes que vou a esses encontros, saio achando que vocês não fazem questão alguma de se relacionar comigo. Não me levem a mal, mas acho que a reunião de pais e mestres é um momento precioso. Compareço a todas, buscando entender melhor a proposta educacional da escola, os projetos que vocês estão desenvolvendo, a avaliação dos caminhos trilhados e saber dos planos futuros. Gosto também de escutar os desafios, as dificuldades que o grupo enfrentou, os conflitos, ouvir relatos de como os nossos filhos estão aprendendo a viver no coletivo, com todas as suas dores e delícias. É muito legal quando a escola usa este tempo que passamos juntos para se apro...

Sherekas na praia.

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Sherekas na praia. Três mães tomam caipirinha na areia enquanto os filhos estão no mar pegando jacaré.  - Gente, a Fulana veio me pedir um conselho. O Beltraninho quer ver mulher pelada e pediu que ela compre uma Playboy pra ele. Ela não sabe se compra ou não. - Quantos anos o Beltraninho está? - Dez. - E o que você disse pra ela? - Disse pra comprar logo a revista pro menino, oras! - Ah, me desculpe, mas eu discordo. - Como assim? - Flor, deixa eu te dizer, mãe é mãe. Tem um código. E nesse código está escrito que não fornecemos álcool, cigarro, maconha e mulher pelada. - É verdade. Ele que se vire. Dez anos já consegue espiar num buraco de fechadura, roubar revista da portaria do prédio… - ...Google, flor. Vai dizer que ele ainda não aprendeu a digitar “mulher pelada” no Google? (Risos) - Aliás, outro dia uma amiga minha foi fazer uma busca no Google, botou a letra "S" e o Google completou "Shereka". (Risos) Foi o filho dela...

A observadora de mísseis.

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A observadora de mísseis. Conheci Dalal em Tel Aviv. Não sei bem sua idade. Mas é idosa e caminha com uma certa dificuldade, arrastando suas pantufas calçadas sobre meias para varizes, que vão até o joelho. Dalal não se cobre, porque é árabe cristã. Nasceu e cresceu na região e foi testemunha de todas as suas transformações, desde a ocupação inglesa na Palestina até a formação do Estado de Israel.  Conta que seus olhos já viram muita coisa. Guerras, revoltas, atentados, terrorista sendo arrastado vivo em motocicleta, terras tomadas e famílias apartadas. Viu a chegada dos judeus, com seus hábitos estranhos de gente que vem de terras ainda mais estranhas. Viu chegarem os etíopes e suas mulheres de rosto fino e tatuado. Viu nascer árvore onde era deserto e cidades em locais onde nem as ovelhas queriam pastar. Se um dia os judeus fossem embora, Dalal diz que iria com eles. Diante da minha surpresa ela explica que prefere a vida daquele jeito. Diz que antes era ...

Avisado!

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Avisado! - Moça, quero meu ingresso de volta. - O que houve senhor? - Essa porra de filme é uma viadagem só.  - Senhor, posso ver seu ingresso?...Desculpe, mas aqui está carimbado que o senhor foi avisado do conteúdo homossexual do filme. - Sim, mas eu achei que o Capitão Nascimento ia entrar no barraco e encher de tapa esses viadinhos filha da puta. - Não entendi, senhor… - Porra, quando eu ia imaginar que o próprio Capitão Nascimento é um tamanho baitola? - Senhor, esse filme não é do Capitão Nascimento. - Como não? Olha o cartaz, minha filha! - Senhor, aquele é o Wagner Moura. O ator que fez o Tropa de Elite. Mas esse é outro filme, outro diretor, outra história... - E você me avisou? Cadê o aviso…”CUIDADO, NÃO É TROPA DE ELITE”? - Senhor…eu não sei o que dizer… - Óbvio que não sabe. Porque eu estou certo. Me devolve meu dinheiro e encerramos esse assunto. Eu não vou pagar pra ver bichinha se pegando.  - Clayson, QAP?...

A escola humanizada precisa existir.

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A escola humanizada precisa existir. Agora que a escola com tecnologia começa a existir , fica a pergunta: Quando os prefeitos e governadores vão investir na escola humanizada? Uma escola onde o respeito mútuo é a base das relações. Onde os alunos se sintam acolhidos, valorizados e queridos. E os mais vulneráveis se sintam seguros. Uma escola que defenda valores humanos, não apenas nos murais, mas no dia-a-dia, exemplificando na prática e na postura dos educadores, o que é ou não aceitável numa sociedade verdadeiramente humana e justa. Quando teremos escolas com prédios felizes? Espaços alegres e aconchegantes, como devem ser os locais onde se promove o saber. Locais tão queridos que as comunidades se apropriam, sentem-se parte e zelam por eles. E não lugares sombrios, com aparência de delegacias cinzentas, cheias de grades e cadeados, de onde a única coisa que se quer é fugir. Então, senhores governantes, quando virá a escola feita para promover o s...

A escola interativa começa a existir

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A escola interativa começa a existir. Uma das mais ousadas experiências em educação pública está pra acontecer em São José dos Campos. A cidade, polo aeroespacial, agora também vai levar tecnologia para todas as escolas municipais. É o projeto Escola Interativa, que já começou dando um notebook para todos os professores e instalando projetores interativos e banda larga de 30 mega, nas 600 salas de aula do ensino fundamental. Agora, a partir do segundo semestre, o projeto se amplia com a doação de um tablet por aluno do 6º ao 9º ano e, a partir do ano que vem, do 1º ao 5º. O que mais me chamou a atenção neste projeto é que, apesar de sua grandiosidade, ele foi concebido para ser apenas mais uma ferramenta para o professor, que ocupa lugar central no plano. O sistema lhe dá total autonomia de uso, permitindo que ele escolha como usar as ferramentas e quando. Também permite a gestão total dos tablets dos alunos. Por exemplo, ele pode bloqueá-los quando quer a galerinha focada em ...

Músico de rua.

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Músico de rua. É do tipo de mãe que procura apoiar o filho em todas as suas iniciativas.  Aos cinco ou seis anos, o menino inventou de tocar um instrumento na rua, como os músicos que via nas idas ao centro da cidade. E levaria seu chapéu de mágico para colher as moedas que por acaso alguém lhe desse.  A mãe comprou a ideia na hora. Achava positivo ele viver essa experiência. Foram até a praça central e escolheram um cantinho movimentado para o garoto tocar. Puseram o chapéu para os trocados e combinaram da mãe ficar meio afastada, num ponto onde ele pudesse vê-la.  O menino começou a tocar sua concertina e logo chamou a atenção dos transeuntes. Uns achavam fofo aquele menino tão pequeno e tão concentrado em tocar seu instrumento. Outros sorrindo lhe davam moedas ou guloseimas. Alguns paravam pra ouvir.  Ficaram ali uma meia hora. O menino encarnado no papel de músico e a mãe orgulhosa espiando de longe. Até que um guarda se aproximou e...